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Para além de Chiavenato no Ensino de Administração

Por Constantino Oliveira


Idalberto Chiavenato ocupa um lugar incontestável na história do ensino da Administração no Brasil. Seus livros foram, e ainda são, companheiros de gerações de estudantes, professores e profissionais que buscavam compreender as principais teorias administrativas de forma acessível e organizada. Ao longo das últimas décadas, sua obra se consolidou como referência quase obrigatória em cursos de Administração e áreas correlatas, como Contabilidade e Gestão de Pessoas. O mérito é inegável: Chiavenato conseguiu traduzir conceitos muitas vezes densos, oriundos de diferentes tradições teóricas, em uma linguagem didática, esquemática e objetiva. Em um país onde a literatura acadêmica em Administração era, por muito tempo, escassa e dispersa, seus textos se tornaram uma espécie de manual padronizado para alunos e docentes.

A contribuição de Chiavenato vai além de simplesmente “resumir” teorias clássicas. Ele trouxe sistematizações que ajudaram a organizar o pensamento administrativo, facilitando a compreensão de escolas como a Administração Científica, a Teoria Clássica, a Teoria das Relações Humanas e tantas outras. Essa capacidade de estruturar conteúdos foi essencial para a consolidação do ensino da Administração como um

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campo acadêmico e profissional no Brasil. Muitos estudantes só tiveram o primeiro contato com Taylor, Fayol, Weber ou Mayo por meio de suas sínteses, que serviam como ponte entre as teorias originais e a prática didática das salas de aula. Nesse sentido, sua obra cumpriu um papel fundamental de democratização do acesso ao conhecimento.


No entanto, justamente por seu caráter didático e acessível, a obra de Chiavenato também passou a ser alvo de críticas dentro dos estudos organizacionais. Muitos pesquisadores apontam que, ao simplificar demais os conteúdos, há o risco de reduzir a complexidade das teorias a esquemas ou quadros comparativos que não capturam suas nuances. A Administração, enquanto campo de estudo, não se resume a receitas de gestão ou manuais de boas práticas. Ela envolve disputas teóricas, críticas sociais e epistemológicas, além de diferentes perspectivas sobre como entender as organizações e o trabalho. Nesse ponto, as obras de Chiavenato, ao privilegiar uma abordagem descritiva e prescritiva, deixam em segundo plano tais dimensões.


Outro ponto de crítica, especialmente em suas primeiras edições, diz respeito à escassez de referências detalhadas sobre as fontes utilizadas. Muitos capítulos apresentavam teorias e conceitos sem indicar claramente de onde vinham as citações ou em quais textos originais se baseavam. Para fins didáticos, essa escolha pode ter funcionado: simplificava a leitura e evitava sobrecarregar o estudante iniciante com uma bibliografia extensa. Contudo, do ponto de vista acadêmico, isso gera limitações, pois impede que o leitor aprofunde seus estudos nas obras originais e desenvolva uma leitura crítica dos autores apresentados.

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Há também a crítica de que os livros de Chiavenato permanecem muito centrados em uma visão funcionalista e instrumental da Administração, isto é, enxergam as organizações principalmente como sistemas que devem buscar eficiência, eficácia e produtividade. Essa visão, embora útil para estruturar práticas gerenciais, pouco dialoga com outras abordagens mais críticas ou interpretativas, que exploram as organizações como arenas de poder, espaços de conflito, de cultura e de construção social. O resultado é que, embora os estudantes aprendam uma base sólida de teorias clássicas, muitas vezes ficam limitados a uma compreensão que não contempla os debates mais amplos do campo.


Além disso, o impacto internacional da obra de Chiavenato também é questionado. Enquanto no Brasil e em outros países da América Latina ele é amplamente lido, sua influência em círculos acadêmicos internacionais é mínima. Isso acontece porque sua produção está muito mais voltada ao mercado editorial e educacional do que à pesquisa científica publicada em periódicos de prestígio. Dessa forma, Chiavenato é valorizado como autor de livros-texto, mas não como pesquisador de referência em debates globais da Administração. Essa distinção reforça a crítica de que sua contribuição é mais pedagógica do que científica.


Apesar dessas críticas, é inegável que os livros de Chiavenato abriram portas e criaram um alicerce para o ensino da Administração no Brasil. Eles serviram como uma “cartilha” inicial, sem a qual talvez muitos cursos não tivessem conseguido estruturar suas disciplinas. O desafio, entretanto, é não ficar apenas em Chiavenato. Para que a formação em Administração seja robusta, é preciso avançar para além da leitura introdutória, explorando autores críticos, debates contemporâneos e perspectivas diversas sobre organizações e sociedade. Isso significa que o estudante deve utilizar Chiavenato como ponto de partida, mas nunca como ponto de chegada.


Portanto, a grande lição que se pode tirar é dupla: reconhecer o papel histórico e pedagógico de Chiavenato, mas também compreender seus limites. O ensino da Administração no Brasil precisa continuar evoluindo, incorporando novas teorias, pesquisas e perspectivas, de forma a refletir a complexidade das organizações na sociedade contemporânea. Valorizar Chiavenato é reconhecer sua importância como “porta de entrada” no campo, mas para formar administradores e contadores preparados para os desafios atuais, é fundamental buscar uma formação mais ampla, crítica e plural. Somente assim, poderemos ir para além de Chiavenato.

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